20.5.10

Assimetria

"A cosmologia sugere assim que após o Big Bang, formaram-se grandes quantidades de matéria e anti-matéria, mas elas logo se aniquilaram, produzindo o Universo dominado por radiação em que vivemos. (...) um bilhão de prótons aniquilaram um bilhão de anti-prótons produzindo dois bilhões de fótons… (...) para cada um bilhão de anti-prótons produzidos nos primeiros instantes do Universo, teriam sido produzidos um bilhão e um prótons. Um próton a mais. Uma pequena, ínfima assimetria, responsável por nossa existência." *
[ texto na íntegra, clicando aqui.]

Era exatamente sobre isso que eu conversava com meus asséclas.
Eu li e re-li, em voz alta, o artigo acima várias vezes antes que eles entendessem pelo menos o suficiente para que eu pudesse iniciar meu próprio discurso:

Quem nunca me ouviu falar dos abismos? Quem nunca me ouviu falar das distâncias?
E dos vazios?
Pois bem! Não haverá grandes novidades hoje de novo, haverá apenas a repetição do que eu sempre afirmo só que de vestes novas.

Há vazios, distâncias e há abismos.
Dentro de um só um pode estar, repito.
O que quero saber - o que sempre quis - é: por que isso fere?
Porque há de ferir a unidade?
Onde é que o par é melhor que o ímpar?
Pro diabos Fábio Jr. e suas metades da laranja!, minha laranja é inteira, ninguém a partiu.
E sei que as suas também são.
Somos todos laranjas inteiras!
(Alíás, por Zeus! Não somos laranjas coisa nenhuma... somos pessoas!)
Porque essa necessidade de estender-se além de si? Que pretensão é essa? Quem nos deu o direito?
Ou melhor, quem nos deu a obrigação?
Pois se fosse um direito eu já teria largado mão faz tempo!
Mas ainda assim, ainda com todo o repúdio que aprendi a sentir pelo duo, ainda assim... ainda  inconformo-me com a vida solo.
E todos, todos sem exceção, o fazem da mesma forma.
E até o padre e a freira... esses são ainda piores, se querem saber, pois, insatisfeitos com a impossibilidade de encontrar perfeição suficiente de carne e osso para formar par, resolvem formar par com deus - e aí o moldam como bem entendem.
Há também aqueles que preenchem, por segurança, o abismo com ambos os métodos: buscam o amor da terra e o amor dos céus e aí se sentem enfim como uma "laranja inteira" (ou seria tangerina, com tantos gomos?).
Certo, certo... antes que me joguem pedras, preciso adimitir que levo minha inconformidade com fúria em demasia, mas é que me corrói, simplesmente, a idéia de que se precise disso!
E, fatores biológicos à parte, nunca pude entender a infelicidade que sonda a vida solitária.
(Até porque, não ter outro ente algemado a si não significa solidão... mas aparentemente só eu penso dessa forma.)

Hoje de manhã abri o semanário e lá estava a matéria sobre as simetrias cósmicas... e - eu confesso - tudo de que preciso para não explodir com sensações inexprimíveis é encontrar uma forma de transmutá-las em expressões insensíveis!
Aí me expresso violenta... mas fria e seca:
Somos sozinhos, nascemos sozinhos - nós e as estrelas! - e seremos sempre sozinhos. Somos os restos da equação. Somos a xepa.
E o que nos falta, talvez, não seja um outro alguém. O que nos falta - agora acredito nisso piamente - é o anti-eu.
O universo nasceu e os casais se formaram e, pasme, nós ficamos para a tia!
Estamos aqui até agora, fim de festa, sentados - olhos cansados de procurar - esperando o par que erguerá a mão e fará conosco a dança cósmica
Estamos aqui, esperando... não a metade da laranja, e sim a face oposta do espelho, aquela que deveria ter vindo nos socorrer.
Porque só assim deixaríamos de ser só.
Só assim...
Só assim é que o carbono viraria luz.

*Método textual deliberadamente copiado  inspirado nas Cosmicômicas do Calvino, que, por sinal, é meu escritor preferido.

Um comentário:

  1. Talvez o problema seja o lugar onde procuramos, sempre fora, nunca enxergando dentro. E a resposta vem de dentro. Tudo o que é necessário para a vida está lá. Por isso a frustração nos relacionamentos, procuramos algum retorno... algo que venha do outro e preencha. Nunca acontece... Não enxergamos que somos inteiros, que há um universo dentro de mim.. e de você.

    Amo seus textos, você escreve de forma bonita muito do que eu penso e já pensei.

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