2.10.11

Madrugada do dia 2 de outubro


Conversei com um tal de Vicente ontem por volta da uma hora da madrugada.
Os carros uivavam feito uns debeis-mentais noite a dentro, como que uma afronta às janelas já mais que encortinadas da vizinhança.
Minha casa era um deserto, pelo menos enquanto as luzes se mantivessem apagadas.
Sempre tive esse surto de querer evitar a simplicidade da realidade.
Não! É pouco!
E a verdade é que o escuro facilita.
Vicente era um cara triste, me disse que sentia os ombros, as pernas, o pescoço e o maxilar completamente deslocados.
Vicente disse que tinha certeza de que com um corpo tão arrebentado assim mal poderia ele se sentar para ler um livro.
Eu olhava o homem e pra mim ele era normal.
O homem olhava para mim e para ele eu era normal.
Só que tinha eu também, por baixo de tanta pele e roupa e etc, as minhas próprias veias estilhaçadas e minhas vértebras se calcificando umas às outras - como que insatisfeitas pela minha falta de postura, resolveram tomar suas próprias providências.
Se a gente quiser ser acreditados temos que dar algo em troca.
O que Vicente queria era credibilidade, eu idem.
O acordo foi selado com muxoxos e dares de ombros e o resto da noite foi um longuíssimo "eu sei como você se sente".
No dia seguinte os carros latiam com normalidade para as janelas escancaradas e suas donas de casa penduradoras-de-roupas-no-varal.

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