28.9.12

Diário de Calçada e Coisas Indestrutíveis

Uma árvore que é fina demais e o vento faz dançar como quem espeta um boi pelas ancas, e a cidade dá um grito agudo de quem sente todas as sensações ao mesmo tempo e por isso descobre que não sente nada - a impassividade absoluta pode ser que seja resultado do desespero absoluto.
Eu vi um cometa de três rabos despencando pra cima à luz do dia e pensei se não seria ele um foguete carregando as sensações da cidade dentro e levando pra um outro mundo que já chegou no ponto pra onde o nosso vai: a secura; e pensei se seria uma troca e se eles estariam mandando algo para nós ou se, quiçá, poderiam um dia, quando a gente precisar muito, mandar nossas sensações de volta numa explosão radiativa que mataria os impassíveis e os desesperançosos. Pensei que esse seria o meu fim: ter que engolir meus sentimentos expelidos com tanto esforço de volta, como quem é obrigado a lamber o próprio vômito no chão.
Fiquei ali vendo as árvores fracas, burras!, que não souberam nascer carvalho de aço, e achando tudo muito volúvel, tudo muito fácil de despencar... e no entanto alguma coisa muito sólida fazia um volume a mais no meu peito, feito fosse uma pedra em forma de coração espremendo o coração real contra as paredes.
Descobri assim que tenho mais medo de carvalho indestrutível que de árvore mansa, apesar de toda a admiração, e quando o cometa sumiu no meio das nuvens levando todas as coisas que podem ser levadas mas me deixando a pedra dentro do tórax eu me perguntei com ingenuidade:
Qual é a evolução natural da saudade?

Nenhum comentário:

Postar um comentário