3.5.10

Escotoma

Um homem alto, calado, a quem eu olhava com desfoque para fingir que não olhava, sentava-se sozinho.
Eu, por minha vez, sentava-me com muitos mas, tenho certeza, mais sozinha do que ele jamais esteve.
Meus muitos, também sozinhos - cada um em sua perspectiva estritamente pessoal - , gritavam qualquer coisa uns aos outros ao que eu respondia com risinhos e acenos, mesmo sem fazer idéia do que era dito, apenas para servir de álibi ao meu disfarce óptico.

Não pude, após inúmeras tentativas, arrancar fato tão ordinário de meus pensamentos até entender o porquê de não poder: não pude porque era pesado demais para que eu o tirasse.
E por que pesado? Que peso tem o homem (quase) desconhecido?
O que me pesa não é o homem, ou a curiosidade que me provoca.
O que me pesa é meu modo de ter que ver o que não quero no primeiro plano e ter de ver o que quero no segundo, tão sem nitidez.
O que me pesa é que é assim também que eu vejo todo o resto, é assim também que eu vejo o mundo... é assim que eu vejo a mim.
E o que será - pois certamente há algo - que até hoje eu só soube focar em punctum caecum?

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