22.10.11

Dos ordinários (e seus dias ordinários)

Quando da pane no sistema, deitava-se ao chão com a cara de pão dormido que nunca foi capaz de deixar de ter e punha as mãos sobre os olhos. Meio que como se isso fosse impedir a luz de clarear as coisas.
Não tinha vontade de saber, tinha vontade de não sentir vontades. Era meio que isso.

Meio-dia é um horário danado de ruim.
Se levantava a contra-gosto e  tentava se atirar pelas calçadas largas da avenida, trupicando feito pobre coitado. Queria ir pra frente.. só que não, talvez não quisesse não.
Era a teimosia do meio-dia de sexta, visitante semanal assídua.
Sentia um calor subindo até o rosto, chorava e só saía farelos.
Ninguém, nenhum desses que trupicavam também pela avenida, faziam a menor a idéia; esses suspiravam por aí com suas bocas debochadamente escancaradas - uns insensíveis! - e sequer notavam a costura que o mundo fez pra selar seu bico por umas boas várias horas.
Tinha então vontade de mandar todos se danarem.
Só que também não.

Entre as canelas magrelas e o chão pairavam duas feridas desgraçadamente doloridas.
Daí que se sentia Jesus Cristo, e daí que punha os pés descompromissadamente à mostra, esperando que algum dos insensíveis ao menos tivesse olhos no meio da cara.
Passavam direto.

Uma hora da tarde um helicóptero voava baixo numa linha perfeitamente paralela ao quadro da janela do sétimo andar.
Não conseguia se decidir se mais rápido era ele ou as nuvens. E o que importa? O fato é que ele e as nuvens estavam ambos se indo, fugindo do seu campo de visão... exatamente como tudo o mais.
E não era do tipo de dormir de tarde nem nada, mas, como numa tentativa de adiantar o desfecho de um livro ruim, repousava então de novo as mãos sobre os olhos e forçava o ronco pra ver se desse jeito o sono vinha.

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