18.6.10

Algemas

Às vezes um acha que o outro não vai ceder.
Porque estão ambos à deriva, agarrados a um pedacinho de nada, tentando flutuar em algum ponto aleatório do Oceano Índico, e o outro não quer nadar pra lugar nenhum - mas ele quer.
Aí ele bate as pernas e pateticamente puxa a água com as mãos, como se dalí algumas horas o caminho até a praia mais próxima fosse se revelar.
Ele junta num montinho toda a água que colhe e joga pra trás.
Ele às vezes fica satisfeito consigo mesmo, ele se esforça pra isso, mas ele não é cego e uma hora ou outra ele vê que, se a água de trás não voltou pra frente, outra qualquer ocupou o espaço vazio e nada mudou de qualquer jeito.
É que o outro não quer sair dalí!
Ele sabe e ele não liga, ele e o outro não são siameses.
Ele quer nadar.
Mas o outro não quer que ele nade, o outro sabe que existem tubarões.
O outro sabe das tempestades e sabe que a chance dele não chegar a lugar nenhum é enorme.
E aí que o outro gosta tanto dele que atou seus corpos com trapos do barco naufragado e não deixa que ele parta.
Ele um dia vai descobrir qual é o melhor jeito de explicar pro outro que ele não só deseja, com toda a intesidade que tem, chegar a algum lugar (qualquer lugar, desde que chegue), como ele também sente uma dor desesperada nas pernas e tudo o que ele precisa nesse exato momento é simplesmente esticá-las um pouquinho e torcer pra cãibra ir embora.

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