4.6.10

Carga horária

Ele acordou, no dia 22 de maio, querendo saber do limite.
Ele foi até a cozinha pra ver se topava com alguém que pudesse lhe dizer "até onde as coisas vão".
Não tardou a lembrar que vivia sozinho num apartamento sufocante a duas quadras do metrô.
Aí ele pegou a cafeteira pra fazer um daqueles bem fortes que assim ele achava que o café desceria feroz pela goela obrigando as idéias a subirem pra mente.
Ele engasgou.
Aí achou, com certa razão, que havia assim matado qualquer fio de idéia que pudesse estar vagando por alí.
Ele desistiu do café e pegou o jornal.
Ele achava que na primeira página poderia haver uma resposta.
Nada alí se falava sobre o limite das pessoas, nem do limite do tempo, nem do limite do amor, nem do limite da fé, nem do limite do limite.
Aí ele resolveu que fecharia os olhos e apontaria pra qualquer direção na folha dos classificados - o que viesse seria a resposta.
Ele apontou e o anúncio era sobre um emprego, mas ele não leu nada além do trecho que dizia "de 08:00 até 17:00".
Ele aceitou que "Até 17:00" era o limite.
Limite pra quê?
Botou uma camisa e foi pra rua.
Foi incomparavelmente feliz até as dezessete horas, depois disso voltou pra casa e pra vida e nunca mais pensou no assunto.

Eu é que fiquei pensando, pensei muito!, que se fosse eu, teria prorrogado pra depois que as veias falhassem e as rugas se amontoassem tanto que já não se pudesse ver nada além da minha própria pele.
O limite estaria aí e só depois daí tocaria o sinal e eu poderia descansar de ser feliz.

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