4.6.10

Do Moço e da Moça, terceiro round.

Não me cabe dizer quantos foram os anos e os dias e as horas de contemplação.
O moço pode muito bem ter ficado alí por séculos, milênios e eras tudo  dentro de um segundo apenas pra quem vê de fora.
Mas dentro dele foi simplesmente tempo demais.
Foi tanto tempo que o moço já não tinha mais olhos pra ver, apenas olhos pra olhar.
O moço não ouvia mais nada porque a única coisa que ele tinha ouvido por todo o tempo foi a respiração da moça e isso já havia deixado de ser som... agora era só um prolongamento da respiração dele mesmo. Era como um sinal: ela inspirava e ele acompanhava e aí expirava e ele ia junto.
O moço não sentia mais os pés no chão porque ficou alí tanto tempo que o chão cedeu e abaixo dele podia-se ver claramente o fogo do inferno. Sorte a dele que agora era apenas uma patética entidade flutuante.
O moço engoliu seco tantas vezes - pra não falar naquele tanto de baba que escorreu despercebida - que gosto era sentido extinto, assim como os cheiros do mundo: o único cheiro era o que tinha os cachos de fios dourados da moça.
Foi no fim de alguma dessas tantas eras que se passaram que a moça resolveu olhar pra trás.
Só que o coitado do moço foi pego de surpresa e estupidamente tentou se esconder com medo do que fosse pensar a moça se o visse tolamente parado alí.
Aí ele olhou pro oeste e viu uma outra moça no chão, de frente pra ele.
O moço caiu em si e resolveu que era hora de tentar algo novo, chegou perto da nova moça e disse:
"Eu te amo!"
Mas a nova moça disse simplesmente "não" e foi por isso que no final das contas o moço voltou pra moça - que por sua vez já havia voltado pro vento - e continuou lá agarrado às migalhas do "talvez".

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