18.11.10

'And all I lov'd, I loved alone'

Abria o portão com um pontapé dos bem grosseiros e aí galopava feroz pelas escadas carregando nas costas uns bons mil quilos de livros de matemática e da maledeta da química.
A mãe esperava na porta, mas o sol de meio dia e aquela ladeira toda pela qual teve que se arrastar foram as matérias primas para o colossal (e cotidiano) mal humor.
"Xô pra lá, mulher!"
E aí a mãe ia pro canto.
O almoço a essa hora quase que com certeza já estaria na mesa.
Mas não conseguia nem pensar naquele feijão borbulhante e a sobrecoxa de frango que pelava liberando fumaceira pela casa.
Nessa época do ano era calor pra burro!
Além do mais, não era muito de comer... engolir era um troço que dava muito trabalho.
Era do tipo que gostava mesmo era de respirar.

Mais três passos e abria com satisfação a porta do quarto - o quarto do irmão - e preparava a vitrola (do irmão).
O Lagarto, do Rei Escarlate, no volume máximo.
Se jogava, de mochila e de casaco (casaco no verão! era o estilo), na cama - a cama do irmão.
E era aí mais ou menos, vamos dizer, uns vinte minutos até acabar o lado A.
E mais uns cinco, pra deixar ecoando na alma e pras pernas se acostumarem com a idéia de ter que se mover para as mãos poderem virar o disco.
Com carinho.

O mundo era o saco de pancadas, e o carinho era para aquele momento.
Estava tudo muito claro e (achava) muito bem distribuído.
Que mais que vale a pena? Tudo de que gosta, gosta só.
A mãe não retribui.
Ela ama o amor de mãe, no próprio mundinho. Aí ela também, coitada, gosta só.
Não há mão dupla.
E era tudo assim, e isso enojava e desiludia e transfigurava qualquer sobra de empolgação em receio de trombar com parede.
Deixou de ser receio - era uma certeza.
Mas o Lagarto retribuia... retribuia e dava ainda mais!
Ou então foi tomado demais, gastado demais. E daí foi que simplesmente esgotou.

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