13.4.12

Poço

Às vezes colocam a gente num porão úmido e deixam a gente alí marinando em pensamentos que tem cheiro de pó... e a gente vê um monte de coisas que não quer ver, apesar das vendas que eles enfiaram nas nossas fuças.
E eles não nos dão nada, só o nosso pensamento mesmo, para a gente comer.
E a gente come eles e a gente devora tudo e quanto mais a gente come mais a gente engasga e mais eles viram monstros berralhões na boca do nosso estômago.
A gente só não grita porque meteram uma mordaça na nossa boca também.
A gente, as garotas, ficamos alí com os cabelos derramados no assoalho de madeira velha, carcomida de cupim e arrependimento. A gente derrama um monte de sentimentos obsoletos e enferrujados pelos entremeios dos fios
E os sentimentos e os cabelos e tudo, tudo...
Vai-se tudo para o chão em esparrames, meio que só para dar mesmo à vida esse ar de vaso de porcelana arrebentado.
A gente só não treme porque tem cordas sufocando nossos braços e pernas.
Daí a gente fica alí, todo mundo junto, sozinhos nos próprios espasmos existenciais.
Não serve de nada ter mais de trinta numa mesma sala se ninguém se vê e nem ninguém se ouve e nem ninguém se toca e nem ninguém se sabe.
E nem ninguém sabe nada, que eu sei.
Os cabelos  das garotas se derramam pelo chão feito cacos de vidro ou lágrimas (ou ambos).
Feito sentimentos mesmo... feito sentimentos.

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