6.7.12



Teu coração te impele para fora de ti.
Teu coração te persegue, e já estás quase fora de ti 
e não podes mais voltar.
Assim como um besouro que foi pisoteado, saltas para fora de ti,
 e o teu pouquinho de dureza externa e de capacidade de adaptação não tem sentido.

 - Rilke




O besouro esmagado para fora da própria carapaça, esse é você.
Por todo esse tempo e ainda antes dele: você esperava por amanhã, pelo grande twist, pelo momento em que você deixaria de ser só isso que você é para ser algo de verdade - ou o momento em que você viria a ser o você, o você real.... mas essa carta na manga nunca existiu além da esperança vaga de que ela existisse. E você nunca precisou olhar pra dentro das próprias roupas pra saber que ela não está lá.
(Você não tem cartas na manga, você é um total despreparado; te jogaram no mundo por acaso e sem aviso.)

Nada acontece, passem os anos que quiserem passar.
Você encontra pessoas pelo caminho, besourossoas que mesmo que sejam esmagalhados também ainda assim sabem ser alguma coisa.
Deve ser isso, os esmagalhos dos demais têm significâncias enquanto que o teu é só sujeira mesmo.

Você sabe entrar numa sala e interpretar papel de gente.
Você sabe falar, andar, comer, cruzar as pernas (feito mulherzinha) e sorrir o mais agradavelmente possível.
Isso é a adaptação.
E adaptação é realidade?
Passa duas horas a maquiagem desmancha, sua gosma volta a escapar do exoesqueleto.
(E quem é que pode prender a respiração por tanto tempo?)
Besouro, besouro, besouro... besouro perdeu a voz.
Besouro não tem voz, simplesmente, não tem perna para cruzar, não tem boca para sorrir. Nada.
Besouro enbesoura, esse é o único verbo.
Besouro é feito para abarcar pisoteios.
E você, besouro, se auto-pisoteia cruelmente enquanto tenta se achar.
Você, besouro, se escapa a si mesmo enquanto acha que escapa ao mundo.
Nada faz sentido.
Nada faz sentido e a máscara de gente já não permanece fixa no lugar e cai, chula, escorregando lentamente com a gosma pelo chão.
E o besouro e sua máscara e suas entranhas espalhadas e seu coração derramado permanecem na calçada por mais uma madrugada, enbesourando, e esperando que amanhã seja mesmo amanhã dessa vez - porque dos hojes eles já estão é fartos.

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