29.10.12

3º Manifesto do Terreno Baldio

Ainda tinha uma última poça.
A água pingava sobre ela do fio de um varal velho e formava ondas.
A gente botou um barquinho de papel pra ver se ele ia rodar.
Rodou.
Aí a gente botou um besouro no barquinho de papel.
E uma bandeirola feita de grama e palito de dente: pronto, embarcação completa.
-Quantos besouros mais a gente pode botar?
-Bota aí... uns 15?
Colocamos 16, em uma frota de 10 barcos.
Tudo rodava, rodava, e o tempo empurrava tudo para o momento seguinte que era exatamente o mesmo que o anterior: rodando, rodando, rodando. nada.
O tempo cansou da gente e dos nossos besouros (porque somos uns chatos) e foi empurrar outras coisas em outros lugares; foi empurrar carrinho de criança até ela não precisar mais dele, foi empurrar cabelo de velhinho pro chão, foi empurrar uns jovens pro altar... e demais coisas que ser humano tem que passar.
E a gente já não tem mais que passar por nada, que o tempo desistiu de nós.
A gente não tem mais verbo ter que.
Passou um vira-latas amarelo correndo e nossa miniatura de Atlântico foi para os ares.
Um momento de gargalhada e depois era catar os bichos que se debatiam virados ponta-cabeça na pocilga.
Soltamos todos de volta no mato e fizemos pelotas com os barquinhos encharcados, os quais resolvemos tacar uns nos outros que era pra ver se o tempo continuava esquecido de nós...
E acho que os dedos das nossas almas deviam estar bem cruzadinhos pra que ele esquecesse mesmo, porque a noite naquele dia ficou guardada pro dia seguinte.

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